quarta-feira, 11 de março de 2009

O BALLET DAS FOLHAS - By Reubens,

"O coração é teu, pode sofrer, o rosto é dos outros, tem que sorrir" (santo agostinho)



Hoje ao sair do trabalho, para o almoço, a água banhava a terra – e esta, por sua vez liberava seu aroma avisando que mesmo poluída ainda continua viva!
Os resíduos de um recente artigo que conclui sobre Lilith, a Rainha Súccubus, ainda impregnavam a minha mente (trazendo-me as dúvidas da antropogenesis) quando, virando certa esquina, deparei-me com um ballet de folhas que me deixou paralisado.
Já observaram como são exímias bailarinas as folhas, quando estas caem?
Se não, eu vou tentar traduzir em palavras o espetáculo que eu pude perceber:

Enquanto a chuva caía rala, como lágrimas celestes que trazem o milagre da fertilidade para um camponês, uma alva e fofa nuvem era rude ao empurrar outra de sua espécie, porém negra, de um lado para o outro no céu fazendo a chuva diminuir.
Neste instante Éolo soprou! E a árvore de fronte a poça de água já iniciava seu lamento de perda: Com o peso da chuva e o poder do desprendimento trazido pelo vento de Éolo algumas de suas filhas/folhas seriam levadas embora.
Toda árvore sabe quando vai perder sua filha/folha.
São espertas as árvores, pois observam isso pelo grau de maturidade conferido a cada folha/filha por uma coloração que varia do amarelo ao marrom. E quando chega essa hora até a Mãe Natureza aparece para abraçar e confortar a Mãe Árvore, colocando sua mágica presença em ação.
É a Mãe natureza que se encarrega do serviço fúnebre das folhas/filhas e lhes dando um tratamento de honra: ela manda primeiro algumas de suas mais belas borboletas cumprirem sua tarefa do dia - e num vôo tranqüilo as borboletas cintilando preparam o ar para o ballet.
Quem passa por perto, recebe um susto com o vôo acetinado daquelas coloridas e aladas criaturas – na realidade o vôo das borboletas sobre a pessoas nada mais é do que uma permissão dada pela mãe natureza, por intermédio das borboletas, para que as pessoas possam ver com detalhes aquele rito sagrado de despedida.
Em segunda eis que surge um halo de luz - um presente final enviado por Apolo. Afinal a iluminação é muito importante para qualquer espetáculo além de significar uma forte elevação espiritual. Com o espaço preparado e a luz bem colocada, a Mãe Árvore tenta ao máximo estabelecer uma última ligação com sua filha/folha... Ela envia um pouco mais de sua seiva para alimentar aquelas filhas que logo partirão; a mãe árvore junta levemente alguns de seus galhos na intenção de poder tocar por mais tempo cada folha...
Mas a árvore é lúcida. E sabe que já tem gravado no seu peito de crosta rude, porém macio, um forte afeto por aqueles entes que vê partindo.
Éolo sopra novamente avisando que é hora do espetáculo começar. É como se ele dissesse: - “Despeça-se, velha amiga, escute os pássaros gorjeando. Você já fez seu trabalho!”
É impressionante!!!
Do nada surge um coral de passarinhos que chega para dar melodia ao momento. De repente a árvore mãe sente um espasmo e a filha/folha se descola aos poucos. As borboletas vão ao seu encontro na tentativa de ajudá-la, como se pudessem interferir nos fios daqueles destinos.
E neste exato momento, neste instante que seria fatídico para alguns, é que se percebe o preparo de toda uma existência, de como aquelas filhas/folhas são bailarinas das melhores.
Éolo, o vento, sente a dor da mãe e se revolta. Ele manda mais vento,sem querer, parece um humano impulsivo e sem noção – e esta ação torna o espetáculo ainda mais belo. Por que as folhas/filhas dançam conforme a música que os pássaros gorjeiam sendo regidos pelo vento. Com a música as folhas dão piruetas, saltos, percorrem todo o salão que as borboletas lhes prepararam e terminam com seu gan finale tocando levemente o solo, sem dano algum, como se fossem plumas. Estão mortas!
Mas este fato não é o fim, não ainda.
Elas logo se transformarão em adubo e retornarão para os veios de sua mãe.


Epílogo

Ainda temos e teremos muitos vácuos dentro nós pela frente...
Teremos muitos caminhos escuros, sem halos de luz ou cantos de pardais, para fingirmos que são coloridos. Principalmente aqueles, cravados nas encostas do rio da melancolia, da angústia e da dor.
Parece que cada vez mais apreciamos a capacidade que nos corta dos olhos as coisas
belas e por isso não compreendemos ou compreendemos erroneamente cada detalhe importante e revelador lentamente – somos devagar!
E por isso, ás vezes, alguns são fadados a vagar segurando candelabros com asas aceso pela paixão; e a viver pairando os olhos sujos, imensamente sujos, sobre coisas que na maioria supérfluas estão.
Não haverá os dentes caninos da noite para trucidar aquela folha caída ao chão. Porém, existe o homem que sem compreender direito o sentido do ballet das folhas, vai recolher a filha/folha como se fosse um indigente e a jogar em algum lugar - no lixo talvez. Outros, porém, são mais cruéis e lhe ateiam fogo - aí sim, é o fim! É por esta razão última que a árvore chora! Não pelo ballet da filha.

Um comentário:

Celia Augusta Lopes Ferreira - Duquesa do Tipi, Baronesa do Cratinho de Açúcar, Consóror de Honra Efetiva da Confraria Gastronômica do Barão de Gourmandise disse...

Meu caro
Lindo texto, esse balet de vez em quando eu o vejo aqui de minha janela, e agradeço a infinita graça da vida!
Você me surpreende a cada dia, como as folhas a bailarem pelas ruas...congratulations!
kisses and hugs